sábado, 23 de março de 2013

MÃES

* Maria Luzia Villela

Coisa boa para comer era rara.

Nica ouvia contar do farturão que a família desfrutava no tempo em que viviam na roça. Leite de vaca e cabra à vontade, queijos manteiga, frutas do pomar e do cerrado. Gabirobas. Este nome guardara: um dia comeria essa fruta. Cana caiana...

Havia uma touceira dessa cana plantada no quintal, de vez em quando a mãe descascava uma e cortava em toretes de cinco centímetros e estes em quatro palitos. Eram mastigados até se transformarem em ásperos bagaços, sem sabor. Na trabalhosa mastigação o caldo docinho escapava um pouco pelo canto da boca. Muito bom.

No pequeno quintal da cidade a mãe fazia milagre. Plantava verduras num trecho cercado e milho ao longo das cercas. Assim Nica pôde conhecer o sabor do curau e o do milho verde assado no borralho. Que borralho, ali na casa da cidade, havia: tanto no quintal, na armação de tijolos para ferver roupa, como no fogão à lenha. Outro cercadinho abrigava oito galinhas e um galo. Ovo era a mistura principal e por isso o galo era quase dispensável, pois ovos para chocar... Só de longe em longe. No ninho havia um ovo de madeira, o indez, para estimular as galinhas à botação.

Lá de vez em quando, a mãe ia guardando um ovo por dia até juntar doze e então punha galinha para chocar e uma ninhada de pintinhos vinha a movimentar o quintal. A galinha mãe, ciscando daqui e dali, dava migalhas quase invisíveis aos seus pintinhos; às vezes puxava uma longa minhoca para eles. Tinha que defendê-la contra a gula do galo e das outras galinhas. Assim os pintinhos, como ela, só contavam com a mãe. Galo, pai desnaturado...

Com ela, pior! Pai nem havia em casa....

 

4 comentários:

  1. Belo texto. Que bom que ativou o seu blog. A gabiroba levou-me ao passado, na fazenda da minha avó, andando no cerrado em busca das arapucas armadas e das gabirobas.,,também das maria pretas.
    Mas as marias pretas eram raras, como hoje o são também. Mas a figura do pai...tadinhos . Nem um dia para eles nos dias comemorativos Lembram mas, assim, ant passan,

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  2. Brito, como o farturão só foi contado para Nica e não vivido, acho que ela não conheceu as tais marias pretas. Quanto ao paigalo, sempre houve muitos, e mais galinhas que as galinhas. Todavia, Nica me contou que o dela era só um pai ausente, que a visitava 2 0u 3 vezes ao ano,e a mãe era de criação e prima do pai que enviuvara. obrigada pela visita. Luza

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  3. Ao passar pela net encontrei seu blog, estive a ver e ler alguma postagens é um bom blog, daqueles que gostamos de visitar, e ficar mais um pouco.
    Eu também tenho um blog, Peregrino E servo, se desejar fazer uma visita.
    Ficarei radiante se desejar fazer parte dos meus amigos virtuais, saiba que sempre retribuo seguido também o seu blog. Deixo os meus cumprimentos e saudações.
    Sou António Batalha.

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lyg930@hotmail.com